por Comba Marques Porto
Na tarde de sábado
passado - 27/10/12 - o público de ópera do Brasil teve a chance de assistir a
soprano Renée Fleming atuando no papel de Desdemona da ópera Otello, de Verdi, apresentada no MET e transmitida ao vivo em cinemas de várias cidades, inclusive no Rio de Janeiro. Já neste fim de semana, será possível assistir a diva americana ao vivo e em pessoa, no Theatro Municipal do Rio de
Janeiro, em recital único, acompanhada ao piano por Gerald Martin Moore.
Renée Fleming
é uma grande artista. Está entre as mais lindas e mais preparadas vozes líricas
do cenário mundial e, quiçá, da história da ópera – pelo menos desde quando inventada a reprodução de som e (depois) de imagem que nos permite conhecer vários interpretes
e, assim, estabelecer comparações. Renée não é só a beleza
e a perfeição de uma voz privilegiada. A par de ser uma mulher muito bonita, é também dotada
para a arte do teatro, o que a qualifica como uma intérprete completa, feita de
encomenda para a ópera. Sua Desdemona de sábado passado prova que
sua voz mantém o mesmo frescor do início de sua carreira em meados dos anos 80 (a estreia no MET deu-se em 1991). Teremos,
então, a oportunidade de assistir no Rio um grande soprano no auge de sua trajetória
artística.
Até ontem, quando comecei a escrever esta matéria, véspera do recital, nada havia sido divulgado pela grande imprensa sobre a passagem de Renée Fleming
pelo Rio de Janeiro. Apenas o tijolinho do programa na revista "rioshow"de O Globo de sexta-feira, 2/11. Tal silêncio bem traduz a falta
de interesse pela ópera por parte dos que hoje respondem pelas ações culturais
no Rio de Janeiro. É incompreensível que a vinda ao Brasil de um soprano do quilate
de Renée Fleming passe quase despercebida. É lamentável que não se tenha pensado em organizar um segundo recital de Renée para o
grande público, a preços mais acessíveis. Algo que viesse representar uma boa oportunidade de incentivo à arte lírica e à diversidade de difusão musical e cultural. Talvez falte informação sobre o que significa a soprano Renée Fleming no panorama
mundial da música.
Nós, cariocas, temos boas raízes de uma formação
musical diversificada. Se temos o samba na origem de nossa musicalidade, também temos a modinha, o choro, os batuques de África, a música religiosa, a música de concerto e até mesmo a ópera que bombava na cidade já no século XVIII. A difusão da cultura demanda ações, interesse, sobretudo da parte de quem tem nas mãos a administração pública. Vale lembrar o bom resultado da iniciativa do maestro e compositor Heitor Villa Lobos, que nos
anos 40/50, introduziu a disciplina do canto orfeônico nas escolas da rede
pública do Rio de Janeiro, então capital da república. Era a boa música ao
alcance de todos, pois a experiência foi também assimilada pelas escolas
particulares. Infelizmente, em larga escala, isto se perdeu. E assim lá estão os jovens de hoje entregues à mesmice de algo que chamam "música" muito rico em barulho e pobre em inteligência e musicalidade. Hermeto Pascoal tira música de tudo o que passa por suas mãos. E tudo o que faz é música da melhor qualidade. Não há de minha parte qualquer preconceito quanto a gênero musical e inventividade musical. O ruído de um martelo a bater pode virar música, sim. Mas haja dom, conhecimento de música e inteligência para extrair de um simples objeto tal efeito!
O mais importante na educação e na formação cultural e musical de um povo é a diversidade. É preciso, pois, que os variados gêneros artísticos sejam levados ao conhecimento de todos. Só assim será possível escolher, experimentar algo diferente e criar música de boa qualidade, independentemente de estilo, gênero, ritmo, instrumentos utilizados, etc.
O mais importante na educação e na formação cultural e musical de um povo é a diversidade. É preciso, pois, que os variados gêneros artísticos sejam levados ao conhecimento de todos. Só assim será possível escolher, experimentar algo diferente e criar música de boa qualidade, independentemente de estilo, gênero, ritmo, instrumentos utilizados, etc.
Renée Fleming canta somente no Rio. Para a programação cultural da cidade isto não é pouco. E o que dizer, então, para a história do Theatro Municipal, onde ela se apresenta?! Penso que os teatros,
como as pessoas, constroem as faces boas de suas identidades a partir das vivências mais
enriquecedoras. A literatura, a boa música, a boa encenação teatral, em suma, o
evento artístico de boa qualidade fortalece tanto a alma das pessoas como a
alma dos teatros. O nosso Municipal, por exemplo, é um espaço rico em vivências
culturais diversificadas e de grande valor artístico, especialmente no campo da
música, da ópera e do teatro.
É, pois, de se agradecer à Renée Fleming pela escolha de sua apresentação na cidade do Rio de Janeiro. Seu
recital, com certeza, trará ao palco do Theatro Municipal um glorioso momento
de conexão com sua verdadeira essência, com o acervo imemorial inscrito em sua bela estrutura
arquitetônica, gravado no solo onde pisaram e ainda podem pisar grandes artistas, acolhido nas sombras da coxia e nos perfumes dos camarins; presente na memória e na emoção de um público que se renova mas não perde a vinculação com a arte. Não sei se um pouco da história do nosso Theatro Municipal foi contado à querida soprano Renée Fleming. Se foi, ela há de deixar o Rio com a
sensação de sair daqui fortalecida. Conto as horas para te ver e te ouvir, Renée. Viva a música, viva a ópera, sempre!
Bravô, Comba!
ResponderExcluirUm beijo e bom programa, hoje!
Christina
É lamentável, Comba. E em São Paulo não foi diferente. Pesquisei sobre os dois recitais de quarta e quinta e só encontrei destaques nos blogs especializados. Nos jornais, a Folha publicou o seguinte em sua programação:
ResponderExcluirRenée Fleming - quarta (7) e quinta (8)
Destaque na cena lírica, a soprano americana, três vezes vencedora do Grammy, apresenta recitais na Sala São Paulo.
Beijos.
Voltei para me retratar.
ResponderExcluirO Valor Econômico publicou ótima entrevista com a Renée Fleming. Parabéns a Regina Porto.
http://www.valor.com.br/cultura/2892330/renee-fleming-exibe-seu-lado-mais-intimista-em-sao-paulo