segunda-feira, 22 de abril de 2013

Entre belezas e temeridades. A estreia de “Aida”






por Comba Marques Porto

A montagem desta Aida despertou o entusiasmo do público. Afinal, era a primeira ópera da "temporada" de 2013. Era a comemoração do bicentenário de nascimento de Verdi. Era a estreia do maestro Karabtchevsky na direção da programação de ópera do TM. Era a primeira ópera montada depois dos noticiados conflitos entre a administração do teatro e seus corpos estáveis, estes fragilizados pela inércia dos gestores quanto à realização dos concursos públicos necessários à completar os conjuntos e, assim, estruturar suas atuações em temporadas bem planejadas, dando vida à casa que, lamentavelmente, mais vem servindo à locação para eventos variados do que à apresentação dos programas mais condizentes com sua história, a ópera em especial.  

Aida não é uma ópera popular por acaso. É muito mais que a sua Marcha Triunfal. É obra que transcende o fato de ter sido escrita por encomenda para a comemoração da abertura do Canal de Suez. A partitura desta ópera contém trechos belíssimos, verdadeiro alento para quem vai à ópera em busca da boa música. Quando bem executada, podemos sorver toda a riqueza da escrita de Verdi. 

Sempre me emociono com o final do 2º ato. Verdi de fato soube conquistar o público com aquela configuração em tutti, aliás, presente em outras de suas óperas: solistas em sexteto, coro, vigorosa massa orquestral.
 

O final do 2º ato, a meu ver, foi o momento mais significativo da estreia de sábado. Foi bonito ver o público aclamando o coro, os bailarinos e a orquestra do seu teatro de ópera. Sem dúvida, a regência de Isaac Karabtchvsky em muito contribuiu para os acertos de coro e orquestra. Senti aqueles efusivos aplausos como que carregados de algo mais que uma satisfação momentânea. Corporificaram-se ali vivências remotas de um público fiel à ópera, de um público caloroso, mas não menos exigente, feito da gente engalanada somada à massa que se apertava nos bancos da galeria (até 1934 não havia cadeiras numeradas neste setor). Gente que deixou suas emoções gravadas naqueles mármores, nos pilares do palco, naquela rica cúpula, gente que fez a glória de muitos cantores e determinou o fim das carreiras de tantos outros.  

Na estreia de ontem, assistiu-se a uma apresentação de altos e baixos, de belezas e de temeridades.  A ópera quase foi a nocaute no terceiro ato.  

O que se passou com o tenor Rubens Pellizari no intervalo entre o 2º e o 3º ato? Deprimiu-se subitamente? O som do arrastar de suas sandálias foi verdadeira metáfora de sua falta de ânimo. Se já não foi dos melhores desde o início, seu desempenho vocal parecia rolar ladeira abaixo, entre desafinações e agudos mal sustentados. Em outros tempos, teria sido simplesmente vaiado. 

A soprano Fiorenza Cedolins ficou muito longe de empolgar no papel título. Lastimável sua atuação no 3º ato. Por milagre, ou porque somos hoje bem mais tolerantes, escapou da vaia.  Oxalá estes solistas sejam capazes de superar suas dificuldades para melhor honrar o contrato nas récitas restantes. 

A mezzo Anna Smirnova brilhou, sim, com sua Amneris, sobretudo na cena do julgamento -4º ato), um dos trechos mais belos escritos por Verdi para a sua Aida. Pena é que a ópera pede harmonia de qualidade de seu elenco. Quando hoje me perguntaram o que achei da ópera (para a qual fui com o mesmo entusiasmo de toda a vida) eu não sabia bem o que responder. Dizer que foi parcialmente boa? Não me convenço com tal resposta. Agradeço ao maestro Isaac Karabtchesky por seu trabalho, pelo empenho em dirigir um bom espetáculo. Mas ele bem sabe que sem um bom tenor e um bom soprano não se faz uma Aida para ser lembrada.  

Aguardemos agora a próxima atração: “Die Walküre”, em celebração do bicentenário de Richard Wagner.  

2 comentários:

  1. Comba quem conhece a ópera, viu a récita de estréia com seu comentário. Muito bom; pena que os deslizes tenham acontecido como muito bem narrado por você.

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  2. Ahhh... Obrigada, Raulino. Pois... Apenas uma boa solista para um conjunto de 6, não dá, não é? Fosse no tempo de nossos pais, o uhuhuhuhh! da vaia soaria tão significativo quanto os aplausos emocionados ao coro, maestro e orquestra no final do 2º ato. Beijo.

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