quinta-feira, 12 de julho de 2012


 Comentário ao post "Rigoletto matou-se ontem no Rio!" 

por Comba Marques Porto

Sua crítica sobre o Rigoletto em cartaz no Teatro Municipal me lembra os bons tempos em que a imprensa tinha papel destacado no sentido da formação de uma “cultura de ópera” que, ao meu ver, nesta cidade, se perdeu. Por aí, em parte, explica-se a estranha reação das pessoas que gargalharam no momento em que o bufão descobre-se vítima de sua própria urdidura: no lugar do Duque, cujo assassinato encomendara a Sparafucile, encontra sua filha – o seu maior tesouro.

Onde a ópera não se faz ao vivo e com frequência, morre o debate, rarefaz-se a difusão de informações, enfraquece-se o conhecimento sobre o gênero. Resultado disto é o comportamento disparatado do público.

Neste ano de 2012, a história se repete: não temos uma temporada estruturada, como a que transcorre no vizinho Teatro Colón, de Buenos Aires. Não consta do noticiário econômico que os argentinos estejam mais ricos do que nós. Entretanto, o Colón está vivo, apresentando uma temporada de ópera rica em títulos, inclusive com novidades, como a Tetralogia, de Wagner, em uma só sessão, em parceria com o teatro de Bayreuth. Já o Municipal registrará neste ano apenas duas óperas – Rigoletto e Traviata (anunciada).

Quando ainda não se falava em globalização, as estrelas da ópera europeia faziam excursões completas por essas bandas do sul, com parada obrigatória no Municipal do Rio e no Colón de Buenos Aires. As articulações ocorriam, a despeito das facilidades da internet e de todo o dinheiro que corre hoje mal aplicado aqui e pelo mundo afora.

Ainda sobre o Rigoletto, acrescento que, de fato, o libreto de autoria do Francesco Piave não abriga a ideia do suicídio do indigitado bufão. 

Filmagens em São Conrado para as cenas do suicídio de "Rigoletto"

Assim termina o texto:

RIGOLETTO
Glda! mia Gilda! ... È morta! ...
Ah, la maledizione!


(Strapandosi i capeli, cade sul cadavere dela figlia.)
FINE.

Arrancando os cabelos, Rigoletto cai sobre o cadáver da filha. É o que anota Piave como movimentação cênica para o final da ópera.

O trabalho do Sr. Maestrini me pareceu bonito, sintonizado com a estética da obra. Porém, a ideia do suicídio de Rigoletto, como acima se vê, não consta da obra de Verdi/Piave. Não li e não tenho à mão o romance do Victor Hugo – Le Roi s’amuse – em que se baseou a feitura do libreto da ópera. Até gostaria de saber se consta da obra a cena do bufão atirando-se ao rio. Se consta, com todas as vênias, parece-me uma solução óbvia e pobre, pois o verdadeiro suicídio do bufão ocorre psicologicamente, quando se dá conta do resultado trágico e doloroso de sua vingança.


A licença poética é um importante recurso que tantas vezes multiplica e embeleza a obra de arte, sobretudo no teatro e na ópera. Mas é sempre bom ter em mente o compromisso com o sentido original pensado pelo autor. No caso da ópera, a chave está no libreto. Admiro muitas das montagens contemporâneas que engradecem a obra com inimaginável criatividade. Mas defendo a lealdade ao libreto. As melhores audácias visuais e cênicas são exatamente aquelas que não se distanciam do libreto.

Um comentário:

  1. No texto da peça - Le roi S'amuse - que está na internet também não existe a situação do suicídio de Triboulet.

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